O vocábulo princípio por si só já diz: o que é começo, o primeiro. Segundo Jaqueline Russ,[1] princípio, do ponto de vista temporal, é: começo, ponto de partida; do ponto de vista causal é a causa ou fonte de ação e, do ponto vista normativo, princípio é regra ou norma de ação. Com base nisso, podemos ver que princípio ou princípios nos trazem ideia de algo básico e fundamental. Podemos, inclusive, dizer que princípios determinam ponto de partida para uma ação. É até comum dizermos: “tenho por princípio peneirar toda informação que me é passada”. Ou então: “Fulano não tem princípios”, significando que não tem normas essenciais.
Segundo o dicionário Michaelis, princípios são “doutrinas fundamentais ou opiniões predominantes”. E o dicionário Houaiss define como “opiniões, convicções”. Na verdade, princípios são convicções que temos sobre alguma área de conhecimento ou ação. Todos nós possuímos princípios ou convicções que regem nosso modo de interagir com o mundo e com os outros. A grande questão é: que princípios são estes.
Ao passarmos para o terreno religioso, é comum se dizer: “tenho princípios religiosos” ou “tenho princípios bíblicos que dirigem minha vida”. Na Carta aos Hebreus encontramos registrada a expressão “os princípios elementares dos oráculos de Deus.”[2] No grego, “princípios elementares” é “stoikeia”, palavra que pode significar o abecê de um determinado conhecimento. E, mais adiante na epístola, há também a expressão “os princípios elementares da doutrina de Cristo”.[3] No original grego, “princípios” é “arkes”, significando “a compreensão inicial da posição cristã que a diferenciava do judaísmo”.[4] Logo, os dois textos fazem referência aos fundamentos iniciais da doutrina cristã que, segundo o autor, são: arrependimento de obras mortas, fé em Deus, batismos, imposição de mãos, ressurreição de mortos e juízo eterno. Esses ensinos da fé cristã eram “os princípios” que os cristãos, aos quais foi dirigida a Epístola aos Hebreus, deveriam conhecer, e que se diferenciavam dos ensinamentos do judaísmo, ao qual o cristianismo é superior.
E, agora, quando falamos de princípios batistas seriam eles a mesma coisa que doutrinas batistas? Embora os princípios batistas se baseiem nas páginas do Novo Testamento e se relacionem com as doutrinas e práticas cristãs, não são o que denominamos doutrinas batistas. O entendimento que temos é que princípios são convicções que norteiam nossa maneira de ler e interpretar a realidade que nos rodeia e como interagimos nela. Apesar de neotestamentários, os princípios batistas não abordam sistematicamente as doutrinas cristãs como estão devidamente expostas na “Declaração Doutrinária da Convenção Batista Brasileira”, documento que é a súmula do que nós, batistas, cremos por doutrinas bíblicas. Podemos exemplificar mostrando que o nosso entendimento sobre Deus na pessoa do Pai, do Filho e do Espírito Santo, sobre o homem, o pecado e a salvação são doutrinas bíblicas comuns também a outras denominações evangélicas. Segundo Justo C. Anderson, os princípios batistas são “as pautas ou as normas sobre as quais os batistas têm baseado sua atividade orgânica e a raiz das quais têm justificado sua própria existência, ou seja, sua identidade denominacional”.[5]
Com base no que já vimos, podemos afirmar que os princípios batistas são um conjunto de convicções que definem o perfil das crenças e práticas batistas. Por isso, conforme John Landers, “os princípios batistas são linhas mestras de interpretação da fé cristã que distinguem os batistas das demais denominações”.[6] Sem o princípio da autoridade da Bíblia não há o testemunho de que Deus falou e se manifestou maravilhosamente na história humana. Não há o registro da intervenção divina a favor da nossa salvação. Se não há a autoridade das Escrituras, como declarar a competência do indivíduo em buscar, sob a ação e orientação do Espírito Santo, a verdade sobre Deus e sua relação com ele? Como o indivíduo se torna responsável diante de Deus?
A necessidade dos princípios batistas
Por que insistir tanto nos princípios batistas como elemento direcionador em relação a outros cristãos? Por que insistir nessa marca registrada dos batistas? Em primeiro lugar, historicamente os batistas têm-se distinguido, desde sua origem, por esses princípios. Segundo, porque diante da multiplicidade de igrejas (e como há novas igrejas aparecendo a cada semana nas esquinas das cidades brasileiras), nós precisamos firmar nossas convicções num todo coerente. Há muitas igrejas com rótulo de cristãs que, apesar de afirmarem ser a Bíblia a única regra de fé e prática, aceitam outras fontes de revelação que determinam suas crenças e práticas. Aqui temos um exemplo de como um princípio precisa interferir na nossa prática. Nossos princípios não devem ser aceitos apenas na teoria, mas devem ser postos em prática. Se nós cremos que Jesus Cristo é o Senhor da igreja, como agir seguindo outros senhores?
As igrejas batistas hoje, juntamente com seus líderes, precisam entender que o abandono dos nossos princípios diluem a nossa identidade. E se algum dos princípios se perder, os demais serão afetados. Nossos princípios básicos são um todo que se sustenta. Por isso precisam ser divulgados e estudados pelos crentes e, principalmente, postos em prática.
Na nossa abordagem dos princípios batistas, oito serão focalizados. Há autores que os enfocam de maneira diferente da que fazemos aqui. John Landers, por exemplo, acrescentou o princípio “O Espírito Santo em cada crente” no seu livro Teologia dos Princípios Batistas, fazendo frente ao ensino pentecostal do batismo no Espírito Santo como ato posterior à conversão.
Nós consideramos neste estudo os seguintes princípios batistas à luz das Escrituras e aplicados ao nosso dia-a-dia como indivíduos e como igrejas:
1. Princípio do senhorio de Cristo
2. Princípio da autoridade da Bíblia
3. Princípio da igreja composta de membros regenerados e biblicamente batizados
4. Princípio da igreja como comunidade local, democrática e autônoma
5. Princípio da igreja separada do Estado
6. Princípio da liberdade religiosa e de consciência
7. Princípio da competência do indivíduo e sua responsabilidade diante de Deus
8. Princípio da missão da igreja no mundo
*Roberto do Amaral Silva é pastor Batista, bacharel em teologia pelo Seminário Teológico Betel, Rio de Janeiro. O conteúdo deste artigo é um extrato de sua obra "Princípios e Doutrinas Batistas" publicado em 2003 pela JUERP. Sua obra completa está disponibilizada gratuitamente em PDF.
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[1] RUSS, Jacqueline. Dicionário de filosofia. São Paulo: Editora Scipione, 1994.
[1] RUSS, Jacqueline. Dicionário de filosofia. São Paulo: Editora Scipione, 1994.
[2] Hebreus 5.12.
[3] Ibid., 6.1.
[4] GUTHRIE, Donald. Hebreus, introdução e comentário, São Paulo: Mundo Cristão, 1984, p. 129.
[5] ANDERSON, Justo C. Historia de los bautistas – (suas bases e princípios), El Paso: Casa Bautista de Publicaciones, Tomo I. 1978, p. 44.
[6] LANDERS, John. Teologia dos princípios batistas., Rio de Janeiro: Juerp, 1986, p. 12.
Nota: Este é um extrato de Princípios e doutrinas batistas por Roberto do Amaral Silva, pg. 17-20
Nota: Este é um extrato de Princípios e doutrinas batistas por Roberto do Amaral Silva, pg. 17-20
exelente artigo , Parabens!
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