Imagem: Severino Tomaz de Aquino (Assembleia da Convenção Batista de Caruaru na PIB da cidade) |
A palavra igreja provém do grego ekklesia (ek=fora; kaleo=chamar; portanto, chamar para fora). Ekklesia era a assembléia de cidadãos convocados para o espaço público para decidir assuntos de interesse da sua polis, ou cidade.
influência com “voto de cabresto”. Inclusive, há irmãos que ficam revoltados ou magoados quando a decisão da assembléia não está a seu favor.
Essa atitude difere completamente de uma verdadeira democracia eclesiástica. Segundo Justo Anderson, “uma congregação batista local teoricamente é uma democracia pura”.[37]
Citando outro autor, Anderson diz que Thomas Jéferson, principal autor da Constituição Americana, sempre dizia que as igrejas batistas eram exemplos perfeitos de democracia.
Quando examinamos as páginas do Novo Testamento, vemos que o governo eclesiástico era uma “democracia sob o senhorio de Cristo”. No primeiro capítulo de Atos, Lucas narra que a escolha do substituto de Judas se deu após a oração em que os apóstolos pediram para que José, também chamado Barsabás, ou Matias, fosse eleito. Ao orarem, disseram: “Tu, Senhor, que conheces o coração de todos, revela-nos qual destes dois tens escolhido”. O mesmo aconteceu na eleição dos sete e a decisão agradou a todos (At 6.3-6). Na controvérsia da circuncisão, conforme Atos 15, lemos: “Então, pareceu bem aos apóstolos e aos presbíteros, com toda a igreja, tendo elegido homens dentre eles, enviá-los juntamente com Paulo e Barbabé, a Antioquia” (negrito nosso). É interessante notar que a carta enviada pela liderança a Antioquia diz: “Pois pareceu bem ao Espírito Santo e a nós não vos impor maior encargo além destas coisas essenciais” (At 15.28). Grifamos “bem ao Espírito Santo e a nós”. Por isso, escreve Landers, “a igreja é, idealmente uma teocracia, mas Cristo não está mais presente visivelmente para tomar as decisões. Hoje, o Espírito Santo se manifesta através do voto do seu povo”[38]. E “a democracia, o governo da congregação, é a forma certa somente na medida que, orientada pelo Espírito Santo, providencia e exige a participação consciente de cada um dos membros nas deliberações do trabalho da igreja”. Por isso, conclui: “Nem a maioria, nem a minoria, nem tampouco a unanimidade, reflete necessariamente a vontade divina”[39].
Não preciso dizer que democracia supõe autonomia da igreja local. Mas é bom frisar que autonomia (etimologicamente significa lei própria ou capacidade de criar as próprias leis) quer dizer capacidade de governar-se a si mesmo. Todavia esse “governar-se a si mesmo” está subordinado às orientações de Cristo e a seu senhorio, como já vimos. Portanto, a igreja se autogoverna debaixo da orientação do Novo Testamento, no qual estão as normas de Cristo para o seu povo.
A autonomia da igreja local é um brado contra as seguintes formas de governo eclesiástico:
1) O governo monárquico exercido pelo papa que se supõe infalível. Abaixo dele há uma hierarquia, sob a qual está a comunidade local, a paróquia, que não tem voz nem vez. Hoje, algumas igrejas evangélicas estão caminhando para esse governo eclesiástico no qual o “papa” da denominação é chamado de bispo ou apóstolo, encastelado sob o manto da “incontestabilidade”. Para não dizer “infalibilidade”.
2) O governo episcopal, que é o governo dos bispos, tal como na igreja episcopal e na igreja metodista. Os bispos são o clero superior e os pastores inferiores. Há muitas igrejas que teoricamente não se enquadram nessa categoria, mas são episcopais no governo. Há algumas igrejas batistas da Convenção Batista Nacional (ala da renovação espiritual) cujos pastores têm sob sua tutela vários outros pastores de igrejas de bom porte numérico e financeiro (portanto, prontas para serem autônomas). Apesar de se dizerem batistas, não se guiam pelo princípiobíblico de igreja local, democrática e autônoma.
3) O governo presbiteriano centraliza-se na autoridade dos presbíteros. As decisões da igreja ficam a cargo do pastor e dos presbíteros. É uma espécie de governo representativo. Acima da igreja local há o presbitério (regional), o sínodo e o supremo concílio.
Agora desejo fazer duas considerações acerca desse princípio batista.
Primeiro, não se deve confundir conceito de igreja com o de reino de Deus ou o reino dos céus. Jesus mencionou 112 vezes “reino” (basiléia, em grego) que significa “governo”, reinado enquanto igreja (ekklesia), 2 vezes. Reino de Deus (ou dos céus) é o reinado ou o governo de Deus na vida dos súditos de Deus ou discípulos de Cristo. Como bem expressou George Eldon Ladd: “O reino é primariamente o reinado dinâmico ou domínio soberano de Deus e, derivadamente, a esfera na qual tal soberania é experimentada (...) A igreja é a comunidade do reino, mas nunca o próprio reino. Os discípulos de Jesus pertencem ao reino como o reino lhes pertence; mas eles não são o reino. O reino é o domínio de Deus; a igreja é uma sociedade composta por seres humanos (...) A igreja constitui-se o povo do reino de Deus, nunca o próprio reino”[40]. Jesus, ao ser interrogado pelos fariseus sobre a vinda do reino de Deus, respondeu: “O reino de Deus não vem com aparência exterior; nem dirão: Ei-lo aqui! Ou: Ei-lo ali! Pois o reino de Deus está dentro de nós” (Lc 17:20,21). A resposta de Jesus deixa claro que o reino de Deus não se identifica com uma organização exterior e visível.
Segundo, não há um conceito de igreja batista identificando-a como denominação, como se diz igreja metodista do Brasil ou igreja presbiteriana do Brasil. Podemos dizer por exemplo: “As igrejas batistas, que formam a Convenção Batista Brasileira, precisam envidar esforços pela expansão do reino de Deus”. As igrejas batistas, na realidade, se unem voluntariamente em associações e convenções para esforço cooperativo visando a fins comuns. Para isso, as igrejas podem ou não aceitar as sugestões de propósitos, metas e métodos propostos pelas juntas.
Finalizo com as conclusões de E. Y. Mullins, eminente teólogo batista: “Não há que identificar o reino como uma igreja visível ou denominação visível, pois o reino é o reinado invisível e espiritual, sem considerações a fronteiras denominacionais”[41].
Nota: Este é um extrato de Princípios e doutrinas batistas por Roberto do Amaral Silva, pg. 25-28
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[37] ANDERSON, Justo C. Historia de los bautistas – suas bases e princípios. El Paso: Casa Bautista de
Publicaciones, 1978, pág. 65. Tomo I.
[38] LANDERS, John. Teologia dos princípios batistas. Rio de Janeiro: Juerp, 1986.
[39] Ibid.
[40] LADD, George Eldon. Teologia do Novo Testamento. Rio de Janeiro: Juerp, 1985, p. 105 e 106.
[41] TUNNER, J. Clyde. La doctrina neotestamentária de la iglesia. p 19.
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